Outro dia eu estava no telefone com a minha mãe contando pra ela sobre alguns estigmas da bipolaridade. As pessoas não fazem a menor a ideia do que é esse transtorno. Eu até escrevi sobre o que é, os sintomas, mas ainda assim me pareceu tão superficial do que é a realidade que desisti de publicar.

Primeiro quero esclarecer as causas do transtorno bipolar: alterações em determinada áreas do cérebro e nos níveis de vários neurotransmissores. E, claro, predisposição genética, também. Os eventos, os traumas, que ocorrem no decorrer de nossas vidas, são gatilhos para entrar e sair das fases de depressão e de mania, porque na realidade poderíamos ter essas mudanças de humor com ou sem eventos.

Decidi falar sobre alguns sintomas que já me acometeram e que as pessoas não gostam de falar e que são aqueles mais difíceis de lidar.

1 – Agressividade e comportamento violento

O maior estigma de todos é a fase da mania como um todo. As pessoas não têm noção da loucura que é estar maníaco. De verdade. Um interruptor é ligado e estamos eufóricos, querendo conquistar o mundo, porém sem concentração e MUITO agressivos.

No meu caso é quando eu me auto mutilo, de tanta raiva que sinto, fico respondona, literalmente rosnando. E mesmo quando eu não faço nada realmente, os pensamentos são muito violentos.

Porém tem casos de pessoas que sofrem do transtorno e ficam agressivas com outras pessoas. Leio relatos de famílias que se desfizeram por causa disso, pessoas foram presas, porque cometeram crimes.

2 – Paranóia

Eu não estou falando de uma coisinha à toa, estou falando de paranóia real, que paralisa, que te faz ficar em casa por dias, pelos motivos mais absurdos que se tornaram completamente possivelmente reais. E o pior, a gente consegue convencer as pessoas à nossa volta que a paranóia está acontecendo.

É uma sensação de impotência e de descontrole tão grande que desencadeia outros sintomas, como TOC, distúrbios alimentares e ideação suicida. É bem desesperador.

Por toda a minha vida eu achei que estava ficando louca(um clássico, não?), mas depois que entrei na comunidade das pessoas que sofrem do transtorno descobri que a paranóia é um sintoma que acomete em ambos os humores e com isso fiquei aliviada, por saber que faz parte da doença.

3 – Alucinações e psicose

Recentemente decidi abrir o jogo sobre uma série de imagens que via regularmente há anos. Elas apareciam(no passado, porque agora meu antipsicótico está correto) geralmente no banho e eram uma coisa super LSD com figuras coloridas aumentando e diminuindo, rolando na minha frente. E eu não conseguia pensar em outra coisa, ver outra coisa, por uns 2 minutos.

No início eu achava que era como ver aqueles pontos quando você olha diretamente pra luz. Depois, quando eu fiquei realmente doente, eu comecei a pensar que poderia ser alucinação, mas eu não queria contar pra ninguém, porque tinha medo de ser algo pior, porque eu não tinha meu diagnóstico e não sabia que alucinação é algo normal em bipolar tipo I, que é o meu tipo.

O problema é que eu também tive outros tipos de alucinação, psicose. Não só essas divertidas tipo LSD. Tive alucinações em que eu me via me jogando na frente do metrô, na frente do ônibus em movimento, mas de maneira tão intensa que eu tive que me segurar em corrimão, nas pessoas pra não me deixar levar.

A gota d’água pra mim foi quando me vi, no supermercado, tirando um bebê do carrinho, colocando no colo, ninando, dando beijinhos. E eu senti todas as sensações da alucinação. Tive que fazer muito esforço pra voltar pra realidade, mas vi que o bebê estava no carrinho e eu no meu corredor de molhos de tomate. Isso foi na véspera do meu aniversário e em 2 dias eu teria uma consulta com meu psiquiatra. Assim que eu contei tudo pra ele, todos os medicamentos foram modificados e hoje estou me sentindo muito melhor.

Desde então nunca mais tive alucinações.

4 – Comprometimento cognitivo

Ah, como a minha vida teria sido mais leve se eu tivesse o meu tratamento quando criança. Eu passei a minha vida inteirinha me achando burra. Aliás, ainda me acho! Mas a verdade é que o transtorno bipolar altera meu cérebro e as minhas sinapses. Eu não consigo me concentrar ou focar nas coisas como as pessoas normais e a minha memória é completamente comprometida.

Quando eu era mais nova eu tinha que fazer um esforço triplo pra tirar notas boas e era muito frustrante. Eu não entendia porque as minhas colegas de turma conseguiam tirar notas boas com tanta facilidade e eu não. E, dependendo da gravidade da doença, o comprometimento fica pior. Eu não posso contar com a minha memória pra nada, preciso de agenda, caderninho, alarme de celular, de todos os recursos pra eu não esquecer meus compromissos.

5 – Ideação suicida

Não serei detalhista porque não quero alerta de gatilho, mas quem sofre de transtorno bipolar, tem ideação suicida. É horrível conviver com as alterações de humores, a gente se sente um fardo, porque parece que isso nunca vai passar, que nunca estaremos estáveis e porque sabemos que não tem cura. Sem falar naqueles não fazem a menor ideia do que está acontecendo, que não tem diagnóstico e tratamento.

Nosso cérebro é diferente, nosso jeito de olhar o mundo é diferente e, mais, pode mudar da manhã pra noite se o interruptor do humor girar. Logo, se você conhece alguém que sofre de transtorno bipolar, seja paciente. É o que eu peço. Provavelmente essa pessoa terá dias incríveis, mas ela também terá dias reservados, mas não a deixe sozinha por muitos dias. “O Transtorno Bipolar não é uma desculpa, mas uma explicação”.